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A insustentável leveza do grotesco: Squeak The Mouse

Foto do escritor: Carlos PedrosoCarlos Pedroso

Por trás do humor ácido e da ultraviolência gráfica, há um vazio tão profundo quanto o buraco cavado pelas vísceras expostas em cada página.


Capa da Edição Brasileira
Capa da Edição Brasileira

Massimo Mattioli, com Squeak The Mouse, nos entrega uma obra que é ao mesmo tempo, fascinante e irritante, uma ode à provocação pela provocação. Lançado no Brasil pela Editora Veneta, o quadrinho se tornou um clássico cult entre fãs de narrativas sem palavras, mas será que a diversão gráfica extrema consegue sustentar a profundidade que muitos lhe atribuem?


Em sua essência, Squeak The Mouse é uma mistura de Tom e Jerry levado ao extremo e Evil Dead em forma de quadrinhos. A cada virada de página, uma explosão de ultraviolência estilizada, onde corpos são estraçalhados, tripas voam e personagens antropomorfizados participam de uma coreografia de destruição incessante. Há algo hipnotizante nisso, uma espécie de balé grotesco que captura a atenção. Mas a questão que fica é: o que vem depois do choque inicial?


A ideia de um quadrinho mudo é, sem dúvida, instigante. Sem diálogos, as imagens assumem um papel central, permitindo múltiplas interpretações. Essa escolha narrativa abre espaço para que o leitor projete suas próprias ideias sobre a obra, criando camadas de significados que, em muitos casos, talvez nem estivessem na mente do autor. O silêncio gráfico funciona como um espelho, refletindo não apenas o grotesco desenhado por Mattioli, mas também nossas próprias tendências ao voyeurismo e à fascinação pelo absurdo.

Miolo da edição
Miolo da edição

No entanto, a ausência de diálogos e o apelo constante ao choque também revelam as limitações da obra. Mattioli parece mais interessado em provocar reações instantâneas do que em construir uma narrativa que nos faça pensar além do óbvio. Sim, é possível identificar ecos da infância, com suas referências a desenhos animados, misturados ao peso da vida adulta — uma existência onde, como o texto sugere, todos os dias matamos algo para continuar vivendo: um desejo, uma ideia, ou mesmo a inocência. Mas essa tentativa de simbolismo muitas vezes soa rasa, como se estivesse lá apenas para justificar a carnificina desenfreada.


O grande mérito de Squeak The Mouse é sua habilidade técnica e o domínio do ritmo narrativo. Cada página é meticulosamente desenhada para capturar o olhar e manter o leitor imerso. A arte, com seu traço limpo e dinâmico, é impressionante, contrastando ironicamente com o caos que retrata. É um espetáculo visual que, mesmo quando incomoda, mantém uma estética curiosamente atraente.

Miolo da Edição
Miolo da Edição

Mas a experiência também traz um cansaço. A ultraviolência se torna previsível, quase entediante, após certo ponto. O humor negro, inicialmente afiado, perde impacto conforme a repetição toma conta. Squeak The Mouse parece querer nos lembrar constantemente de sua transgressão, mas transgressões repetidas deixam de ser surpreendentes.


Ainda assim, há algo a ser dito sobre o papel dessa obra como um produto de sua época. Lançado nos anos 1980, Squeak The Mouse dialoga com o espírito anárquico de um período marcado por exageros e pela busca por rompimentos com normas culturais. É uma obra que, em sua despretensão, reflete o zeitgeist de uma geração que queria rir do absurdo e desafiar convenções.


No final, Squeak The Mouse não é uma obra para todos. Para aqueles que buscam uma experiência visceral, sem amarras e com um toque de nostalgia desconfortável, o quadrinho é um prato cheio. Mas se o leitor espera algo além do choque e da diversão momentânea, é provável que, ao fechar o livro, fique se perguntando se essa jornada valeu a pena.


Nota final: Mattioli nos entrega uma peça de arte bruta, que fascina e repele na mesma medida. É possível admirar sua ousadia e habilidade técnica, mas talvez devêssemos aceitar Squeak The Mouse pelo que realmente é: um espetáculo grotesco, divertido e passageiro. Se há profundidade, ela está mais em nossas projeções do que na própria obra em si.


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